sexta-feira, agosto 29, 2003

Famoso sob a tinta de Zola



Então, tem aquele livro do Émile Zola chamado L'Assomoir (vou abreviar para AR). Não sei a tradução. Sei que precede um clássico, muito conhecido dele chamado "Nana". Adoro esse cara. Li outro livro dele agora pouco (Au bonheur des Dames, que vou abreviar para ABD), mas me lembro mesmo é desse que citei aí encima, o AR. Porque o estudamos há uns 2 anos atrás no colégio. Fizemos um estudo absurdamente profundo, sobre diversas partes do livro. Eu consegui entender muito bem tudo o que o autor quis dizer.
Me lembro que Zola foi um excelente naturalista. E que parecia colocar os personagens numa caixa onde poderia brincar com eles, fazer o que bem entendesse. Manipulá-los como se fossem fantoches. Lembro que no AR a personagem tinha uma ascensão social, seguida de uma queda vertiginosa. Enquanto que nesse que li agora pouco, o ABD, a personagem pricipal tem uma ascensão constante até o final do livro. O mais legal não é entender isso, mas observar como o autor descreve os "altos e baixos" dos personagens. Onde tudo parece conspirar para um mesmo fim. A personagem não cai sozinha, tudo à sua volta cai com ela. A personagem não está apenas feliz, mas também é Primavera, os pássaros cantam, o céu está lindo, ela vai receber um aumento, larga a bebida...(isso é só um exemplo).
Então, meu pai pediu demissão (demissão induzida) há 2 dias. E como acabei de ler o livro naturalista. Entrei nesse clima de conspiração e sincronismo que havia ali. Onde pra mim, a perda do emprego seria o começo da queda. O "tropeço". Comecei a imaginar como meu caro Zola estaria descrevendo os próximos 2 meses. No dia seguinte da demissão, o filtro de água da cozinha já quebrou, eu quebrei um copo de uísque, meu pai chutou meu copo de água molhando todo o tapete, não pára de chover. Eu provavelmente vou sair do clube pra economizar, minha faculdade não sai de greve, comecei a procurar um emprego e não pára de chover. Como no livro, o autor faria ricas descrições sobre a pobreza que estaria se instalando na minha casa. Sobre como deixaríamos de comprar sabonete Dove e começaríamos a tomar banho com sabão de coco. Usaria um vocabulário triste, descreveria a casa como cada dia mais suja, mais quebrada, menos cuidada. Utilizaria os mais horríveis campos lexicais. Aos poucos a inveja, ganância, avarice tomariam conta de todos. Nos descreveria como animais, devorando toda comida que encontrássemos. Faríamos sons bizarros. A sinestesia estaria sempre presente. A miséria corromperia a família toda, as palavras fraternidade e compaixão não teriam mais sentido. O leitor sentiria pena de nós. E no fim do livro, diante de um final tão horrendo, diante de uma realidade totalmente diferente da inicial, o leitor choraria. E assim como eu, adoraria eternamente Zola e o seu Naturalismo.



:: Ouvindo :: Pure Morning, Placebo.

Rabiscos na cela:
- Israel Son - 22:54




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