terça-feira, agosto 05, 2003
Meu Signo de cristalA Virgem entrara em seu quarto aos prantos. Nada daquilo estava certo para ela. Sentia vontade de tudo mudar, ao mesmo tempo sabia que nada podia fazer senão aceitar e esperar que tudo mudasse por si só. Por isso pôs-se à chorar em seu canto. Do outro lado do quarto, ao lado de sua cama, havia uma cristaleira. Mesmo com a vista embaçada pelas lágrimas a virgem podia admirar o brilho da sua pequena coleção de cristais exposta ali dentro. Havia um Touro, um Peixe, um Leão, uma Mulher, um Cabrito, um Escorpião, uma Balança, um Caranguejo, um Aquário, um Carneirinho, um Centauro e finalmente uma cabeça de duas Faces... As 12 peças que ganhara ao longo de seus 12 anos de vida. Enxugando as lágrimas do rosto, a garota se levantou, caminhou até o móvel, colou a face contra a porta de vidro e ficou observando o efeito que a luz da janela tinha sobre sua querida coleção. Tanta beleza fez seus pensamentos divagarem. Ficou por um longo tempo assim: imóvel. Uma gota salgada escorreu por sua bochecha, lembrando-a de todos os males. Voltou a chorar. Jogou-se sobre a cama, mergulhando seu rosto num macio travesseiro de penas. Em meio aos prantos, de dentro da cristaleira, soou um leve ruído. Um delicado tilintar. Algo se movia ali dentro. Era o Escopião de cristal. Começou a se mover de um lado para o outro. Como que tentando chamar a atenção da pequena Virgem desamparada. Finalmente, entre dois soluços a garotinha pôde ouvir o barulho vindo da cristaleira. Levantou-se da cama e foi logo abrindo a porta de vidro para tentar apanhar o animalzinho que se movia. O Escorpião, percebendo a euforia da menina, parou de se mover, como que voltando à ser um objeto inanimado. Ela o sacudiu em suas mãos, tentando fazer com que se mexesse novamente. E nada. Voltou a colocá-lo em seu lugar, entre a Balança e o Caranguejo. Percebendo o desinteresse da menina, o Escorpião voltou a se mover. Fazendo muitos barulhos com as patas, tentando chamar a atenção novamente da garota novamente. E toda vez, a mesma situação se repetia: sempre que a Virgem se mostrava muito interessada no Escorpião, ele fingia ser apenas um objeto sem vida. A garota finalmente entendeu o que deveria fazer. Apesar de estar muito feliz, eufórica e interessada no seu precioso Escorpião de cristal que estava vivo, ele não poderia perceber. Era um animal um tanto quanto misterioso. E foi o que fez, aproximou-se do móvel tranquilamente e, como quem não quisesse nada, abriu a porta de vidro lentamente. Primeiro pegou o Cabrito em mãos, esse não se movia. Assoprou a peça como se a limpasse. E colocou-a de volta em seu lugar. Em seguida, fez o mesmo com o Peixe e com o Touro. Depois, até fingiu estar falando com com o Centauro...Finalmente, calmamente se aproximou do Escorpião. O apanhou e depositou sobre a palma da mão. Assoprou sobre ele um vento suave...e aguardou... Discretamente, o animal se moveu. Primeiro só uma pata..depois duas...andou um pouco para frente. Estava testando a garotinha. Ela por sua vez, se continha. Fingia não ligar para a vida de cristal sobre sua mão. Sentindo o menosprezo da menina, o Escorpião pôs a se mover deliberadamente. Adquiriu confiança. Andava até as pontas dos dedos, rodopiava e voltava... E a Virgem, apesar de estar explodindo de alegria em seu interior, não demonstrava coisa alguma, nem sequer um dente. Ele foi subindo pelo punho, ante-braço... A garota sentia cócegas! Queria rir, mostrar ao pequeno Escorpião como estava feliz! Mas não podia, se continha. Com medo de que ele parasse com aquilo tudo, como já o fizera anteriormente. O bicho continuava se movendo, como que provocando a garota, passava agora pelo pescoço, dava leves agulhadas com suas patas na pele delicada da menininha. Sabia que ela gostava daquilo, adorava aquilo! Era uma enorme provocação. A garota sentia um leve choque à cada "passo" do animal. Não conseguia mais se conter, aquilo era muito bom, seu coração batia mais forte, estava suando frio. Até que então, não aguentou mais. Seus músculos faciais se contraíram involuntariamente, primeiro um enorme sorriso silencioso surgiu, até que finalmente, explodiu em gargalhadas! Estava completamente exaltada, gritando de alegria e satisfação. O bicho, descontente com aquilo tudo, deu-lhe uma bela e dolorosa ferroada! As risadas cessaram de imediato e num tabefe só, a peça traiçoeira voou pelos ares e se espatifou contra a parede. A menina não sabia como deveria se sentir, não conseguia entender o que sentir ou não sentia. Há tempos que se coração não batia assim. Há tempos que a felicidade não corria em suas veias. Mas, rápido veio e rápido foi. Nos dias seguintes, a virgem ficou longas horas sentada em frente à sua cristaleira. Ficou observando sua coleção, que agora era formada por apenas 11 peças. Aguardava um novo despertar. Talvez o caranguejo, talvez a balança...Esperava que outra peça de cristal se movesse, trazendo mais uma vez consigo, um pouco de vida. - Israel Son - 19:41 |